terça-feira, 4 de agosto de 2015

Da série: “Ao estado em que o Estado chegou: uma saga da Justiça portuguesa”




Esta legislatura fica inegavelmente marcada pelas profundas mudanças no panorama da Justiça, uma das áreas que sempre foi alvo de queixas por parte do cidadão e dos seus agentes, contando com uma Ministra da Justiça que de pacífica teve pouco. Desde a reforma do mapa judiciário com um fundamento que podemos até entender mas que na realidade veio criar um fosso ainda maior entre os Tribunais e os cidadãos, passando pela guerra com a Ordem dos Advogados, muito graças aos novos Estatutos, e a reforma do Código de Processo Civil, que a pouco e pouco vai conquistando o seu lugar nas reformas que não foram assim tão mal esgalhadas, culminando no Regulamento do CPAS.


Contudo, a poucos meses do fim da legislatura, surge a imposição dos notários contribuírem com 10 % dos seus honorários para o financiamento do apoio judiciário no caso de inventários, algo que ficará para os anais de uma das maiores imbecilidades que se conhece (só suplantada pelo regulamento do CPAS). Não é compreensível que sejam os notários a contribuir, com 10 % dos seus honorários, para um sistema que deve ser o Estado, através dos impostos que cobra, a providenciar. O apoio judiciário não é uma mera ajuda assistencialista, é uma das atribuições do Estado, através da eliminação de barreiras económicas para que todo o cidadão possa aceder ao sistema de justiça do nosso País, e não um mero capricho que o Estado se possa desonerar, atribuindo precisamente a um dos agentes do sistema de acesso a obrigação de financiar o referido sistema de apoio judiciário.

A opção quase esquizofrénica e aberrante tomada pelo Ministério da Justiça, máxime, pela Ministra da Justiça, é a prova provada de como se pretende fazer frente aos poderes instalados da Justiça de forma completamente errada, afastando do mercado de trabalho os mais novos e menos experientes e que consequentemente têm menos capacidade para sustentar os desvarios que se têm vindo a suceder. Contudo, esquece a Ministra que nada é eterno, nem mesmo os diamantes, e que a renovação nas carreiras de notários e advogados deve ser uma realidade acessível a todos os que querem fazer da advocacia ou notariado a sua profissão.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Mitos Urbanos: Das ratazanas do Convento de Mafra ao Governo de Pedro Passos Coelho



Após ter sido confrontando com a memória das suas palavras quanto à emigração, Pedro Passos Coelho reagiu qualificando tal lembrança como um mito urbano. Fazendo fé na velha máxima que o eleitorado tem uma memória de 6 meses e utilizando o que se pode apelidar de uma espécie de revisionismo histórico, o Primeiro-Ministro tenta emendar a mão com um erro gravíssimo, o da mentira descarada e de falta de humildade para admitir o que disse. Contudo, não foi apenas este o único mito urbano deste Governo, a saber:
- O mito urbano do colossal aumento de impostos;
- O mito urbano do aumento do desemprego e do trabalho precário em Portugal;
- O mito do aumento das desigualdades sociais;
- O mito urbano da destruição do tecido empresarial de Portugal;
- O mito urbano do desinvestimento na Educação e na investigação no nosso País;
- O mito urbano da privatização selvagem de empresas estatais estratégicas e fundamentais;
- O mito urbano do desmantelamento do SNS;
- O mito urbano da irrevogabilidade da sobranceria governativa;
- O mito urbano do retrocesso na luta pela igualdade e por direitos sociais;
- O mito urbano da imposição de um paradigma que serve os fortes e destrói os fracos.

Muitos outros mitos ficam por enumerar, com a certeza que todos eles foram vividos na pele por milhões de portugueses e por mais que o queiram desconsiderar e omitir, o sofrimento das pessoas e a realidade desmentem a mitomania deste Governo.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Da série: "Piquenas e médias notas a um discurso neo-liberal"



Esta semana já deu que falar o corte nas pensões anunciado em modo "deixa-me atirar o barro à parede e ver o que dá", pela Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, num montante que equivale aos cortes de três anos, 600 milhões de euros. Apesar da folga orçamental, do acréscimo da receita, e confrontada com ao crescimento do fantasma que surgiu não se sabe bem de onde e apelidado de dívida pública, a solução passa pelo corte radical do orçamento de pensionistas. Mais um vez a estratégia do rigor e do grande desígnio nacional que apelidam envergar bate com a realidade, como é possível continuar a cortar a quem já foi autenticamente trucidado nestes anos de austeridade? A insensibilidade social que tem sido uma das grandes marcas desta governação volta a manifestar-se e as pessoas continuam a ser meros números numa tabela de excel, e o mais grave é que não se vislumbra qualquer mudança de política no futuro no que ao CDS-PP e PSD diz respeito. Contudo, e atendendo à ausência de um programa político da coligação deixo aqui uma sugestão: Acabar com a possibilidade da Segurança Social, através do IGFSS, utilizar o dinheiro dos contribuintes para investimento em bens mobiliários, produtos financeiros e outros que tais, algo que incompreensivelmente se mantém e que já trouxe milhões de prejuízo no caso recente da queda das acções da Portugal Telecom. Talvez assim se reflicta em actos a questão do rigor e responsabilidade.


Mas, como nem só de cortes vive a populaça, parece que Maria Luis Albuquerque aderiu à moda do Observador e, como leitora atenta do referido jornal on-line não deixou de fazer uma referência a uma possível revisão do texto constitucional. Nas palavras da Ministra das Finanças ""A nossa Constituição é muito detalhada e uma Constituição que tem muitos detalhes fica mais facilmente desfasada da evolução da sociedade", ou seja, temos uma Constituição demasiado garantística e pouco prática. Atendendo ao historial de violações do texto fundamental que rege a nossa República, sou solidário com o aborrecimento constante de ter de observar as regras mais elementares quando defendemos o progressivo empobrecimento e ajustamento social da sociedade dos nossos dias, de facto, um drama absoluto e incompreensível. Abstraindo a ironia que pautou a última frase, o grau de detalhe que a Ministra das Finanças fala é talvez mais actual que nunca. Como se pode ousar retirar direitos e garantias quando os mesmos são cada vez mais violados em nome do sacro equilíbrio financeiro? Bem sei que a evolução da sociedade preconizada tem vindo a ter um elevado grau de sucesso aos olhos do Governo, hoje temos um fosso cada vez maior entre ricos e pobres, garantimos que uma franja cada vez maior da população fique excluída do acesso ao ensino superior e até ao sistema nacional de saúde e conseguimos colocar uma parte substancial da população no limiar na pobreza. É hora de abandonarem de vez a cruzada da revisão constitucional e talvez fosse de um elevado grau de sapiência consentir que os direitos que muitas vezes menosprezam e dão como ultrapassados são hoje essenciais e merecedores de uma redobrada atenção e defesa.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Contradições insanáveis: o FMI, a UTAO e o CFP.


O FMI tem sido pródigo na elaboração dos mais variados relatórios sobre a aplicação de medidas de austeridade. Por vezes deparamo-nos com relatórios da espécie “bonzinhos” que falam dos malefícios da austeridade como quem fala dos malefícios do tabaco em jeito de pós-aplicação. Houve alturas em que estes relatórios serviram para dar uma imagem benevolente do FMI, visto como um autêntico “bicho-papão” e até deu suporte a um pedido de desculpas ao melhor estilo de “Perdoa-me”. Contudo, o FMI não vive só de relatórios humanizados, tem também a sua quota-parte de relatórios vindos directamente de um dos círculos do inferno de Dante. Nestes, a defesa intransigente e paternalista de uma receita de austeridade em doses cavalares como a salvação de um povo tem vindo a servir de suporte para a aplicação das mesmas, como se o FMI fosse uma entidade sobrenatural e omnisciente da ciência económica. No fundo, ao sabor dos ventos e do ritmo de trabalho dos seus funcionários, o FMI consegue entrar em contradição pelo menos uma vez por semestre, o que poderemos apelidar de uma boa média, sendo que a coerência, a existir, apenas se reporta às constantes tropelias que deveriam envergonhar quem gere uma das maiores entidades financeiras a nível mundial.


Já no plano interno, Teodora Cardoso, Presidente do Conselho Superior do Conselho das Finanças Públicas veio afirmar que nem esta entidade nem a UTAO podem realizar qualquer análise ao cenário macroeconómico apresentado pelo Partido Socialista e que o PSD desejava ardentemente submeter ao crivo das referidas entidades. No fundo, Teodora Cardoso veio apenas confirmar que a ideia do PSD era impraticável e ridícula atendendo às atribuições de ambas as entidades, as quais têm como desígnio a análise das contas públicas e não a análise de cenários macroeconómicos de crivo ideológico propostos por partidos políticos e que nem sequer são uma certeza a nível da implementação. Curioso é saber que esta tentativa de utilização de organismos independentes e públicos, com a missão clara de analisar e avaliar as contas públicas, leva a uma de duas conclusões, ou o PSD está tão preocupado com a apresentação de uma alternativa que em tudo parece apontar para um caminho diferente do trilhado até aqui que se esqueceu, mais uma vez, que existem regras emanadas da Lei (já que as da Constituição da República Portuguesa representam para estes um empecilho e um aborrecimento) que excluíam a análise do cenário por parte da UTAO e da CPF, ou então, e algo que já não se pode considerar uma novidade, face à ausência de propostas e cenários próprios, utilizaram o nome da UTAO e da CPF para mera manobra de diversão, bem sabendo da impossibilidade legal de realização da sua proposta. 

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Provisoriamente Jovens

Volvidos 2 dias desde mais um aniversário do 25 Abril, faz-se imperioso reflectir sobre os Valores que Abril de '74 nos trouxe e pelos quais os nossos políticos e a nossa sociedade se devia reger. A Vida não está fácil: vemos os cortes que este (des)governo fez na educação, assistimos ao aumento das propinas que empurraram centenas de jovens para fora das Universidades por impossibilidade de pagamento, e todos os dias há jovens convidados a sair de Portugal em busca de uma vida de trabalho mais próspera e de melhores condições. Alguns pensam em voltar, outros não. Mas, e não retirando a importância que tem o que foi dito anteriormente, há algo que me preocupa tanto ou mais que os nossos jovens - os nossos idosos. Porque eles são a maioria da população portuguesa, porque nós somos provisoriamente jovens, porque os idosos são sempre os esquecidos.
Preocupam-me aqueles idosos que hoje deixamos sozinhos, abandonados, que desprezamos, que olhamos de lado e que chegamos a dizer serem uma pedra no nosso sapato (sim, como é possível?!). Aqueles idosos que vivem com uma reforma mísera, que precisam de medicamentos para os quais o dinheiro não chega, que vivem da solidariedade (e infelizmente, por vezes, da caridade) de outrem. Aqueles idosos que morrem sós em casa, nos lares, que são maltratados pela sua própria família, que perdem a Dignidade e a Vida antes de perderem a vida - porque não ter a possibilidade de ter um fim de Vida digno é morrer mil vezes. E o que lhes dizemos com todas as medidas que são tomadas, dia após dia, por este (des)governo que só vê números? Morram!
Será que nos esquecemos que somos provisoriamente jovens? 
Quando reduzimos as reformas - reformas essas para as quais eles trabalharam e descontaram -, quando fechamos hospitais, reduzimos médicos e enfermeiros, aumentamos filas de espera em hospitais, aumentamos o preço dos medicamentos, etc, etc, etc, será que nos lembramos que somos provisoriamente jovens?
Quando deixamos aqueles que nos deram tudo sozinhos numa casa, quando os empurramos para um lar, quando não nos lembramos que um só telefonema pode fazer toda a diferença, será que nos lembramos que somos provisoriamente jovens?
E com tudo isto, só me apraz dizer o seguinte: Pelos vistos, este país não é para ninguém a não ser para quem nos governa agora... porque somos provisoriamente jovens -  e enquanto somos jovens mandam-nos emigrar, quando somos velhos mandam-nos morrer!

Este não é o país que eu quero...!

Urge mudar mentalidades, urge mudar políticas. Urge olhar para as pessoas como pessoas e não somente como números. Urge dar voz renovada à Igualdade e Dignidade. Urge implementar políticas sociais, de pessoas para as pessoas, políticas de saúde, de educação, de solidariedade, políticas de inclusão social. Políticas de P grande. Porque a Política só faz sentido quando é feita para as pessoas.

(P)residência




 Já foi! Cavaco Silva fez no passado sábado o seu último discurso na qualidade de Presidente da República, em  comemorações do 25 de Abril. Cavaco é hoje um presidente gasto, descredibilizado, envolto em polémicas e incoerências. Sempre parco em declarações, tem cada vez acertado menos quando usa das suas roucas palavras. Desde o caso  BPN, à confiança afirmada no, já então, moribundo BES, passando pelas dúvidas que chegaram a pairar sobre o seu discernimento mental, não esquecendo o seu quase incondicional apoio à maioria. Foram 10 anos difíceis, principalmente os 5 últimos, em que a sua (p)residênica em Belém não foi clemente com a imagem pública de uma das mais experientes e "antigas" figuras políticas nacionais, que nunca se quis assumir como uma. Esperamos que as legislativas sejam esclarecedoras quanto à formação de governo, e não obriguem Cavaco a presidir...

O estranho caso da coligação Dupont e Dupont


Com grande pompa e circunstância no dia 25 de Abril o CDS-PP e o PSD anunciaram a coligação pré-eleitoral que irão levar a votos no próximo mês de Outubro. A notícia não espanta pois ficaram unidos apesar de renegarem aos princípios, promessas e programa que apresentaram nas últimas eleições, e até ao fim serão "compagnons de route" no confronto legislativo, como seria expectável. Teremos assim uma coligação Dupont e Dupont, inseparáveis nas suas imensas trapalhadas e irrevogavelmente prontos a assumir esse grande desígnio que tão bem souberam idealizar e colocar em prática, o empobrecimento e atraso de um país chamado Portugal.